terça-feira, 30 de março de 2021

Automutilação: saiba o que é, como identificar e ajudar alguém...

 Pessoas que têm o hábito de causar lesões físicas a si mesmas certamente estão vivenciando momentos muito difíceis. A automutilação é vista como uma válvula de escape nada saudável para indivíduos lidando com situações em que a dor psicológica e emocional necessita ser aliviada de alguma forma.

Mas nem sempre é possível identificar previamente o potencial risco ou atitudes recorrentes desse comportamento. Algumas estratégias são utilizadas para esconder as marcas das feridas e, por isso, é importante ter bastante atenção a outros sinais comportamentais.

O que é a automutilação?

A automutilação é definida por lesões provocadas nos próprios tecidos do corpo de forma deliberada, ou seja, propositalmente. A prática é mais comum entre pré adolescentes e adolescentes, e geralmente se manifesta na puberdade.

Idosos também podem apresentar episódios de autoagressão, mas, de modo geral, eles estão relacionados a quadros de demência. Autistas, por sua vez, podem praticar ações automáticas de automutilação como um dos sintomas da doença.

Automutilação é doença?

NÃO! Automutilação não é uma doença, mas pode ser sintoma de diversos transtornos mentais. É preciso ajudar a pessoa a obter auxilio profissional com psicólogo e/ou psiquiatra o mais rápido possível, pois é um sinal que a pessoa está passando por um conflito emocional e precisa de auxílio. 

Alguns estudos indicam que os cortes liberariam mais endorfina em algumas pessoas do que em outras. Quando a substância age no cérebro, provoca sensação de bem-estar que diminui a ansiedade e a tristeza. É dessa maneira que a mutilação acaba se tornando um vício.

Existem dois tipos de comportamento: automutilação com pretensão final de suicídio e automutilação sem ideação suicida.

Automutilação com intenção suicida

Quando o objetivo final é o suicídio, esse cenário acontece em menor frequência considerando o histórico individual. Nesse caso, os meios utilizados para autolesão têm maior potencial de causar morte e são mais destrutivos.

Automutilação sem ideação suicida

As autoagressões mais comuns acontecem por meio de cortes em partes do corpo, queimaduras e arranhões severos na pele. Cortar ou perfurar a pele com um objeto pontiagudo, por exemplo, uma faca, lâmina de barbear ou agulha, e queimar a pele são os mais comuns. Além disso, algumas pessoas têm o hábito de bater a cabeça na parede ou esmurrar a si mesmas. Isso não significa, entretanto, que o comportamento não levará ao suicídio. Um corte mais profundo pode acabar levando o adolescente a óbito, mesmo que essa não seja a sua intenção.

A demora para buscar ajuda pode desencadear um Transtorno Depressivo maior, o Transtorno Obsessivo Compulsivo, mais conhecido como TOC, o Transtorno de Ansiedade Generalizada, Transtornos Alimentares (bulimia e anorexia) e, em alguns casos, o suicídio

O que o estudos apontam

Estudos apontam várias causas, dentre as quais estão: 

  • Conflitos emocionais, 
  • Baixa autoestima, 
  • Dificuldade no enfrentamento de problemas familiares, 
  • Lidar com questões de identidade de gênero, 
  • Perdas significativas, 
  • Abusos sexuais e emocionais, 
  • Bullying e Cyberbullying
  • Abuso de drogas lícitas e ilícitas 
  • Entre outros. 

Os sintomas para identificar a automutilação são:

  • Cortes, queimaduras e cicatrizes recorrentes;
  • Manchas de sangue pelas roupas ou pela casa (lençóis, pia, carpete, entre outros locais);
  • Recorrente uso de roupas largas e compridas para esconder ferimentos (mesmo no calor);
  • Recorrente uso de desculpas como “acidente em casa”, “ando atrapalhado”, entre outras);

Isolamento, em casos de muita dor emocional, leva a pessoa a se afastar e sensibilizar suas emoções provocando irritabilidade, choro, culpa, autocrítica exagerada, entre outros fatores reforçadores do afastamento.       

Qual a prevalência?
A maior prevalência vai da pré-adolescência até a idade do adulto jovem, ou seja, dos 12, 13 anos de idade até os 25 a 30 anos. É uma estatística mundial que se repete. No Brasil, ainda não há dados consistentes sobre esse tipo de comportamento. Em relação a gênero, os estudos internacionais dizem que há uma leve prevalência entre mulheres, mas em alguns países essa estatística é igual entre homens e mulheres. No Brasil, por evidências clínicas, há prevalência maior entre as garotas.
 
Motivações
Existe uma escala internacional de um pesquisador canadense no qual foram identificadas 13 funções. Quando se pergunta a um jovem o que os leva a se mutilar, a resposta deles, a mais prevalente, é: eu sinto uma dor emocional, uma angústia, uma dor no peito, uma dor na alma. A expressão vai variar de acordo com a pessoa, mas vamos caracterizar como uma angústia muito grande com a qual a pessoa não sabe lidar. E dizem: eu não tolero, é insuportável para mim naquele momento e eu me mutilo para o alívio dessa dor emocional. É um discurso paradoxal para as pessoas leigas imaginar como alguém precisa se machucar para tentar se livrar de uma dor emocional, mas é exatamente essa a principal função que os jovens alegam.  Em seguida, vem a autopunição. Em geral, jovens com autoestima muito baixa que buscam uma espécie de punição. É comum dizerem: eu não mereço estar aqui, eu não sinto nada, eu sou um peso… Então, muitas vezes a pessoa se sente tão entorpecida que busca alguma sensação. São discursos realmente muito difíceis de compreender, muito duros, você escutar um jovem falando coisas dessa natureza, mas é assim que as coisas funcionam para alguns deles. 

Contágio
Tem uma estatística internacional que mostra que em torno de 18% das pessoas que se mutilaram o fizeram em grupo na presença de outros e relataram que começaram o comportamento autolesivo por causa do efeito de contágio. Na adolescência, nós sabemos que existe uma necessidade muito grande de se formar uma identidade própria e de pertencer a grupos. Quando você tem um grupo em que alguns dos membros se mutilamnão é incomum que outros também comecem a se mutilar ou queiram fazê-lo, como se fosse um ritual de entrada. É frequente, por exemplo, que em uma sala de aula com um aluno se mutilando, 12 meses depois tenham três ou quatro, justamente pelo efeito de contágio.

Prevenção
A questão parece ser o que podemos fazer para que as crianças desenvolvam habilidades emocionais para lidar com as dificuldades do mundo, já que é impossível poupá-las dos problemas e dores, para que desenvolvam resiliência e habilidades sociais e emocionais para lidar com bullying e cyberbullying, com perdas, com frustrações, para aprender a resolver conflitos sem se machucar e sem machucar o outro. Tudo isso é importante para que a gente possa encarar os desafios do mundo.

 6 perguntas imprescindíveis que auxiliam durante a investigação.

  1. Alguma vez você cortou ou fez vários pequenos cortes na sua pele?
  2. Alguma vez você se feriu de alguma forma e desejou esse ferimento?
  3. Quando fez alguns dos atos, você estava tentando se matar?
  4. Você sente algum tipo de alívio quando provoca esses ferimentos?
  5. Você costuma ter esse tipo de comportamento diante das pessoas com quem convive?
  6. Quanto tempo você gasta pensando em fazer esse ato antes de realmente executá-lo?

Como ajudar a pessoa que passa por uma fase de automutilação?

A primeira conduta a ser seguida é criar um ambiente acolhedor, considerando a individualidade de cada um, sem negligenciar suas dores psicológicas.

A partir daí, é essencial analisar e estabelecer uma relação de confiança e afetividade, buscando dialogar continuamente. É importante, também, tentar mostrar que existem outros meios de solucionar os problemas que não sejam por automutilação.

Uma grande aliada do tratamento é a terapia, que permite identificar e tratar os motivos que levam a essa prática. Desse modo, o apoio profissional auxilia a pessoa a ser capaz de descobrir alternativas saudáveis para resolver suas perturbações.

Dependendo do caso, medicamentos também podem ajudar a diminuir ou cessar os episódios de autolesão — o uso adequado deve ser acompanhado de um psiquiatra e associado à psicoterapia.

Na escola:

  • Educadores, acolham seus alunos, eles não estão chamando a atenção, pelo contrário, eles têm o medo de serem descobertos; escutem o que eles têm a dizer! Falem sobre a automutilação na escola. Proponham debates, soluções, caso estejam com algum aluno com comportamentos que possam ser suspeitos. Respeitem, eles estão em sofrimento;
  • Promovam jogos, dinâmicas e rodas de conversas mediadas por um psicólogo ou professor capacitado para abordar os temas pertinentes aos jovens;     
  • Encaminhem os alunos para ajuda terapêutica, falem com os pais e ofereçam apoio, compreensão e carinho, sem punição e julgamento;
  • Encaminhem para o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) mais próximo de seu bairro;
  • Fale abertamente com seu professor, ele saberá como te ajudar;
  • Se é seu amigo ou amiga que sofre por uma ansiedade intensa e que está se automutilando, tenha um diálogo com ela(e). Ofereça um abraço e diga que ela não está só. Pare para escutá-la, mesmo que isso te choque. Diga sempre que você estará disponível para conversar.

 Para os pais:

  • Observe as roupas que seu filho escolhe. Fique atento às mudanças de comportamento que ele apresenta. Eles podem expressar seus desconfortos com agressividade;
  • Avalie a importância de estarem mais juntos, pergunte sempre ao seu filho: “como você está?”, “com quem você vai sair?”, “precisa de alguma coisa?”, “como posso te ajudar?”;
  • Permita que eles falem o que sentem, não interrompa. Não se desespere, sempre há tempo para resgatá-los;
  • Não sinta culpa. Acolha-os e estejam abertos para um diálogo amoroso e sem julgamentos, eles precisam do seu olhar.

Texto extraído de várias fontes: Scielo; Manual MSD; 

Algumas pessoas não acreditam que o fato de elas praticarem a automutilação é um problema e, por isso, tendem a não procurar ou aceitar terapia. A automutilação traduz um grande sofrimento das pessoas que a praticam e, à medida que elas são acolhidas, ouvidas e orientadas a externar suas preocupações e conflitos, conseguem se enxergar mais seguras e autoconfiantes. A família tem papel fundamental nesse processo e também deve buscar apoio psicológico, quando necessário. Grupos de apoio também podem ajudar, nesses casos.