domingo, 20 de março de 2022

“Repara que o outono é mais estação da alma do que da natureza…” (Carlos Drummond de Andrade)

O dia amanheceu um tanto diferente. A paisagem bucólica sorria timidamente, típico de uma manhã de outono. As árvores perdiam suas primeiras folhas, que coloriam o chão, secando ao tempo. Aos olhos de uns, a beleza estava enfeando. Para outros, renovando-se. O vento fazia-se notar.  

Particularmente, gosto do outono. Uma das poucas definições mornas, relacionadas a meio-termo, que me agradam: nem tão quente como o escaldante verão, nem tão frio quanto o impiedoso inverno. Tecendo uma analogia, o outono é, quem sabe, a estação que mais desperta sentimentos até outrora adormecidos. Drummond também pensava assim ao alertar: “Repara que o outono é mais estação da alma do que da natureza”. 

Talvez seja o outono, entre todas as estações, a que nos oferta mais introspecção. Ao formarem-se os primeiros tapetes coloridos, pelas ruas que passamos distraídos, somos tomados pela sensação de transformação e renascimento.

Logo, num estalar de galhos mortos, nos reerguemos, voltando a ser amor. Posto que, como tão bem disse Renato Almeida: “outono te deixo ficar, tome junto comigo um café. Em contrapartida te peço um pouco de sol no meio da tarde, para aquecer minhas folhas douradas. Pois há ainda orvalho em meu rosto que não pude secar”.

 Marco Paschoal anunciou e seu prelúdio repercutiu em mim como uma prece: “É hora de cortar os excessos, cortar aquele galho que pesa, deixar só os galhos úteis expostos, nenhuma folha. Quanto menos atrito com o vento frio e forte, melhor! É hora de deixar bonita e forte, a terra, lá na raiz, onde ninguém vê, para então, quando chegar a primavera, logo nas primeiras chuvas, tudo novo rebrotar mais lindo, colorido intenso, forte, imponente, radiante. Quero outono não outrora, quero o novo, quero agora”.

O Segredo