Eu conheci razoavelmente bem Clarice Lispector. Ela era infelicíssima, Zézim. A primeira vez que conversamos, eu chorei a noite inteira, porque ela inteirinha me doía, porque parecia se doer também, de tanta compreensão sangrada de tudo. Te falo nela, porque Clarice pra mim, é o que mais conheço de grandioso, literariamente falando. E morreu sozinha, sacaneada, desamada, incompreendida, com fama de ''meio doida''. Porque se entregou completamente ao seu trabalho de criar. Mergulhou na sua própria trip e foi inventando caminhos, na maior solidão. Como Joyce. Como Kafka, louco e só lá em Praga. Como Van Gogh. Como Artraud. Ou Rimbaud. É esse tipo de criador que você quer ser? Então entregue-se e pague o preço do pato. Que frequentemente é muito caro.
Caio Fernando Abreu - Carta a José Márcio Penido