Essa semana assisti novamente a uma palestra incrível de Susan Cain, chamada “O Poder dos Quietos”. E me lembrei de um menino introspectivo, calmo, de olhar doce e gestos quase imperceptíveis que, apesar de ser irmão de uma das minhas melhores amigas de infância e ser meu primo de segundo grau (nossas avós eram irmãs), infelizmente nunca tive a oportunidade de conhecer verdadeiramente. Eu também sou introspectiva, e naquele tempo era ainda mais, pois a timidez acrescentava doses de vergonha e insegurança e, portanto, nunca tive a chance de perceber o que ele realmente carregava dentro de si.
O tempo passou. Há alguns meses, me deparei com várias reportagens sobre um neurologista e professor universitário que teve a iniciativa de levar seus alunos ao centro de São Paulo para que atendessem moradores de rua que vivem em situação crítica nas calçadas. O professor dizia que sua intenção era humanizar mais seus alunos, para que, além do conhecimento científico, eles tivessem maior consciência social também. Não preciso dizer quem era o médico da reportagem. Senti um misto de surpresa, orgulho e grande arrependimento por não ter aproveitado as oportunidades de ter conhecido melhor Mario Vicente, que, apesar de tão quieto, carregava coisas tão extraordinárias dentro de si.
Ao assistir aos vídeos e ler as matérias sobre as conquistas desse menino introspectivo que guardava relíquias incríveis para presentear o mundo no momento oportuno, não pude deixar de refletir sobre estereótipos e julgamentos. Sobre situações que eu mesma vivi na infância e adolescência, sem condições (ainda) de mostrar o quanto eu sabia da vida e o quanto seria capaz de vencer. Sobre como fui julgada incapaz só porque não conseguia (ainda) me posicionar. Sobre como temos a tendência de classificar as pessoas pela superfície, sem nos aprofundarmos nas relíquias escondidas em cada interior. Sobre como o mundo não facilita as coisas para um introspectivo, ao valorizar a extroversão como o único caminho possível para o sucesso.
Enquanto os extrovertidos mostram logo para que vieram, os introvertidos demoram mais para responder à estimulação social. Não sentem essa necessidade ardente de gritar ao mundo seus feitos, suas conquistas, suas qualidades, mas nem por isso deixam de carregar dentro de si posicionamentos belíssimos em relação à vida, desejos de mudar o mundo, amor ao próximo, sabedoria, sensatez e poder de liderança.
Introvertidos muitas vezes são pré-julgados como incapazes, e na infância causam preocupação entre professores e familiares. Porém, é preciso entender que, em sua reclusão, em seus casulos, eles tecem asas para o voo. E quando voam… ah quando voam… chegam mais alto que qualquer um.
O mundo precisa dos introspectivos e das coisas extraordinárias que carregam dentro de si. Mas tudo tem seu tempo, sua hora, seu momento. Introspectivos não chegam chegando, não fazem barulho, não causam estardalhaço para mostrar ao mundo seus feitos, seus dons e talentos. Eles vão devagar, quietinhos, silenciosos, e quando você percebe… que espanto! Aquele menino voou, aquela menina brilhou, como eu não percebi essa riqueza bem aqui do meu lado?
Repare à sua volta. Sempre haverá um introspectivo criando, liderando, sendo exemplo de sabedoria num mundo tão confuso e caótico. Talvez devêssemos aprender mais com essas pessoas. Talvez fosse bom ouvir mais aquele colega de trabalho que não repassa vídeos a todo momento no whatsapp, mas quando aparece, tem realmente algo bom a acrescentar.
O mundo precisa conhecer o poder dos quietos. O mundo precisa aprender a tolerar o silencio, sem exigir dos introspectivos uma postura que não condiz com a alma e natureza deles. O mundo precisa aprender a apostar no potencial dos quietos, entendendo que não é porque eles não anunciam em alto falantes seus feitos, não são capazes de realizar.
Igualmente, os quietos precisam aprender a explorar e distribuir seus dons e talentos. À sua maneira, devagar, modestamente, mas autorizando que o mundo usufrua de sua genialidade, sabedoria, humanidade e lucidez, entendendo que o plantio aconteceu discretamente, mas a colheita pode ocorrer abundantemente…
Fabíola Simões