Impecável, o tempo e suas lições. Implacável e impiedoso desvenda-me a mim mesma, pelo que sou e por quem deixei de ser, a quem me tornei e por tudo que dessa vida pude ver. Já nem sou mais pessoa à flor da pele. Hoje, passado o tempo, sou a própria pele da flor. E vou despindo minha saia de pétalas a cada “bem me quer/ mal me quer” que a vida apresenta. Hoje, na metade do caminho, já não me surpreendo mais com muita coisa. Minhas pressas e intensidades deram lugar a uma quietude de movimentos e contemplação constante. Já não tenho aquela necessidade de ser itinerante nos amores, já que o maior de todos descobri dedicar a mim mesma. Já não preciso de olhares e aprovações. Me permito vivenciar pequenos prazeres e silêncios, tratei de subtrair alguns afazeres desnecessários e as companhias, só mantenho por perto as que me preenchem de alguma forma positiva. Fui redescobrindo a forma plena de sermos nós. Fui descobrindo a maneira plural de sermos sós. Fui renomeando amigos de colegas e sabendo o lugar de cada um. Fui trocando a ordem das prioridades e me enchendo um tanto em observar o vazio das pessoas que estão sempre do lado de muitos. Cansando-me das vitrines vivas do ego nas mídias e nos discursos elaborados que não dizem nada com coisa alguma. Das vitórias recorrentes e de casais plastificados pintados de cor de rosa. Ninguém chora. Ninguém sente dor ou acorda despenteado. O hálito fresco postado nos sorrisos virou hábito e vicio, virou profissão e modismo. Pois esse todo tanto junto somado à minha falta de paciência de perder o tempo que me resta dessa vida, levou-me a uma incubadora de sonhos novos. Um lugar ainda a ser descoberto pela janela dos olhos meus, mas onde ventila somente as verdades de alguém que sempre foi latente demais para assumir tantos cansaços.
Lilian Vereza