Nem toda doença tem causa psicológica, diz estudo...
Que o corpo e a mente estão interligados, um influenciando o outro, não há dúvida. Mas é preciso cuidado com o exagero de eleger a emoção como a causadora de todas as moléstias. A conclusão apressada atrapalha o diagnóstico correto, deixa males sem tratamento e ainda faz o paciente estressado ou ansioso se sentir culpado por adoecer.
Perguntaram a 320 mulheres de São Paulo, Porto Alegre, Rio, Belo Horizonte e Salvador quais eram os fatores de risco para câncer de mama: 87% das pessoas com o tumor e 61% das sadias citaram o stress como vilão número 1. As participantes da pesquisa Câncer de Mama, Experiências e Percepções, realizada pela Pfizer, acreditam que não só o câncer tem origem na alma mas as doenças em geral: 76% das doentes e 68% das sadias. Das primeiras, 47% foram categóricas ao garantir que a causa do tumor delas era emocional. “É um erro de avaliação, um mito a ser destruído”, afirma o oncologista Sergio Daniel Simon, professor-adjunto da Universidade Federal de São Paulo e coordenador da pesquisa. O stress nem sequer aparece na relação de fatores de risco para câncer de mama. Trabalhos científicos apontam as questões da vida moderna: não ter filhos ou ser mãe tardiamente; amamentar pouco; primeira menstruação antes dos 11 anos; menopausa após os 50; dieta rica em gorduras; consumo excessivo de álcool; histórico familiar da doença e terapia de reposição hormonal. “Os estudos globais levam a crer que o stress não tem influência. Os que dizem o contrário trazem amostras pequenas ou falhas metodológicas”, afirma Simon. O oncologista explica que o câncer é uma doença multifatorial, fruto de complexas interações entre o DNA celular e as condições ambientais. Por isso, é improvável que as emoções, por si só, sejam capazes de iniciar a multiplicação desordenada das células – diferentemente do que ocorre nas doenças cardíacas, em que os sentimentos podem ter papel preponderante.
Assim, não se trata de negar a influência do psiquismo nos processos orgânicos. Nem de voltar à época em que o filósofo francês René Descartes (1596-1650) cravou a separação entre corpo e mente. Sabe-se hoje que ambos interagem por meio de uma intricada rede de hormônios, proteínas e neurotransmissores mediada pelo cérebro. Mas é preciso ver o peso de cada um. A pesquisa sobre o câncer alerta para o perigo de ceder ao raciocínio simplista de que toda doença tem origem emocional. “Travestida de interpretação psicanalítica, essa filosofia de almanaque nada mais é do que a versão contemporânea da prática secular de atirar no doente a culpa pela doença”, escreveu o oncologista Drauzio Varella. “Na Idade Média, a hanseníase acometia apenas os ímpios que desafiavam a ira do Senhor; no século passado, morriam de tuberculose as moçoilas desiludidas e os rapazes devassos; e, mais recentemente, adquiriam aids somente os promíscuos.” Para ele, é ridículo esquecer que a hanseníase e a tuberculose são causadas por bactérias desinteressadas no que pensam seus hospedeiros e a aids por um vírus alheio a julgamentos morais.
Transformar as emoções em bode expiatório atrasa o diagnóstico e estende o sofrimento. É corriqueiro tratar arritmia cardíaca como se fosse crise de ansiedade. Sintomas comuns aos dois quadros – falta de ar, palpitações e aperto no peito – favorecem a confusão. Junte-se o fato de que as alterações no batimento cardíaco associadas ao mal-estar nem sempre aparecem no eletrocardiograma ou holter – é necessário um teste em que se avalia a parte elétrica por meio de um cateter introduzido na veia da perna. Levado até o coração, ele identifica o foco do problema (se houver) e o cauteriza. Como o exame é pouco solicitado – por ser invasivo, exigir sedativo, anestesia local em hospital –, o problema persiste. “É mais fácil culpar o doente do que aceitar nossa incapacidade de dar o diagnóstico”, admite Eduardo Saad, coordenador do Setor de Arritmias do Hospital Pró-Cardíaco, no Rio de Janeiro. “Com isso, o paciente carrega o rótulo de ‘portador da síndrome do pânico’ e são grandes as probabilidades de se considerar a doença refratária, ou seja, com sintomas que não cedem, o que requer doses mais altas de remédios.” E ainda há pacientes que ouvem do médico que lhes falta força de vontade para se curar do mal-estar emocional.
Que o corpo e a mente estão interligados, um influenciando o outro, não há dúvida. Mas é preciso cuidado com o exagero de eleger a emoção como a causadora de todas as moléstias. A conclusão apressada atrapalha o diagnóstico correto, deixa males sem tratamento e ainda faz o paciente estressado ou ansioso se sentir culpado por adoecer.
Perguntaram a 320 mulheres de São Paulo, Porto Alegre, Rio, Belo Horizonte e Salvador quais eram os fatores de risco para câncer de mama: 87% das pessoas com o tumor e 61% das sadias citaram o stress como vilão número 1. As participantes da pesquisa Câncer de Mama, Experiências e Percepções, realizada pela Pfizer, acreditam que não só o câncer tem origem na alma mas as doenças em geral: 76% das doentes e 68% das sadias. Das primeiras, 47% foram categóricas ao garantir que a causa do tumor delas era emocional. “É um erro de avaliação, um mito a ser destruído”, afirma o oncologista Sergio Daniel Simon, professor-adjunto da Universidade Federal de São Paulo e coordenador da pesquisa. O stress nem sequer aparece na relação de fatores de risco para câncer de mama. Trabalhos científicos apontam as questões da vida moderna: não ter filhos ou ser mãe tardiamente; amamentar pouco; primeira menstruação antes dos 11 anos; menopausa após os 50; dieta rica em gorduras; consumo excessivo de álcool; histórico familiar da doença e terapia de reposição hormonal. “Os estudos globais levam a crer que o stress não tem influência. Os que dizem o contrário trazem amostras pequenas ou falhas metodológicas”, afirma Simon. O oncologista explica que o câncer é uma doença multifatorial, fruto de complexas interações entre o DNA celular e as condições ambientais. Por isso, é improvável que as emoções, por si só, sejam capazes de iniciar a multiplicação desordenada das células – diferentemente do que ocorre nas doenças cardíacas, em que os sentimentos podem ter papel preponderante.
Assim, não se trata de negar a influência do psiquismo nos processos orgânicos. Nem de voltar à época em que o filósofo francês René Descartes (1596-1650) cravou a separação entre corpo e mente. Sabe-se hoje que ambos interagem por meio de uma intricada rede de hormônios, proteínas e neurotransmissores mediada pelo cérebro. Mas é preciso ver o peso de cada um. A pesquisa sobre o câncer alerta para o perigo de ceder ao raciocínio simplista de que toda doença tem origem emocional. “Travestida de interpretação psicanalítica, essa filosofia de almanaque nada mais é do que a versão contemporânea da prática secular de atirar no doente a culpa pela doença”, escreveu o oncologista Drauzio Varella. “Na Idade Média, a hanseníase acometia apenas os ímpios que desafiavam a ira do Senhor; no século passado, morriam de tuberculose as moçoilas desiludidas e os rapazes devassos; e, mais recentemente, adquiriam aids somente os promíscuos.” Para ele, é ridículo esquecer que a hanseníase e a tuberculose são causadas por bactérias desinteressadas no que pensam seus hospedeiros e a aids por um vírus alheio a julgamentos morais.
Transformar as emoções em bode expiatório atrasa o diagnóstico e estende o sofrimento. É corriqueiro tratar arritmia cardíaca como se fosse crise de ansiedade. Sintomas comuns aos dois quadros – falta de ar, palpitações e aperto no peito – favorecem a confusão. Junte-se o fato de que as alterações no batimento cardíaco associadas ao mal-estar nem sempre aparecem no eletrocardiograma ou holter – é necessário um teste em que se avalia a parte elétrica por meio de um cateter introduzido na veia da perna. Levado até o coração, ele identifica o foco do problema (se houver) e o cauteriza. Como o exame é pouco solicitado – por ser invasivo, exigir sedativo, anestesia local em hospital –, o problema persiste. “É mais fácil culpar o doente do que aceitar nossa incapacidade de dar o diagnóstico”, admite Eduardo Saad, coordenador do Setor de Arritmias do Hospital Pró-Cardíaco, no Rio de Janeiro. “Com isso, o paciente carrega o rótulo de ‘portador da síndrome do pânico’ e são grandes as probabilidades de se considerar a doença refratária, ou seja, com sintomas que não cedem, o que requer doses mais altas de remédios.” E ainda há pacientes que ouvem do médico que lhes falta força de vontade para se curar do mal-estar emocional.
O peso das emoções
Não se trata do jogo de “tudo ou nada”. Há situações em que as emoções repercutem tanto no corpo que podem provocar doenças. Veja quais são as áreas do organismo mais suscetíveis.
SISTEMA CARDIOVASCULAR: No estressado e deprimido, o risco de infarto é 60% maior. Cresce o perigo de acidente vascular cerebral e hipertensão.
ESTÔMAGO E INTESTINO: Dos distúrbios gastrintestinais (úlcera, gastrite, prisão de ventre, intestino irritável), 80% são causados pelo emocional.
PELE: Cerca de 40% das doenças de pele em geral (caso de acne, vitiligo, psoríase, queda de cabelo e herpes) estão ligadas aos transtornos psíquicos.
SISTEMA IMUNOLÓGICO: O stress estimula a produção de cortisol, que enfraquece as defesas. Resultado: cai a resistência a infecções, demonstrou o professor de psicologia Sheldon Cohen, da Universidade Carnegie Mellon, nos Estados Unidos, ao revisar 319 artigos médicos sobre o assunto. Aumentam os casos de lúpus e artrite reumatóide.
Fonte: Revista Cláudia