Sofremos muitas perdas importantes ao longo do caminho, mas podemos extrair aprendizado desses momentos e deixar que a dor, como tudo na vida, venha e vá.
De vez em quando, a vida parece que saiu dos trilhos: um grande amor vai embora, uma pessoa querida morre, um amigo o trai, um filho se muda para outro país, o emprego de anos é perdido inesperadamente. Nesses momentos, fica difícil perceber qualquer coisa além da raiva e da dor e, por mais que muita gente lhe diga que a situação é passageira, a sensação é de que, dessa vez, vai durar para sempre. Acredite: tudo passa e tudo sempre passará, como diz a música Uma Onda, inspirada composição da dupla Lulu Santos e Nelson Motta.
Mas atenção: infelizmente milagres não existem e para sair do buraco você também precisa dar uma força. Afinal, em momentos difíceis, o que mais se ouve é que só o tempo e a paciência são capazes de curar tudo. Antes fosse! Engana- se quem espera que eles, sozinhos, façam alguma espécie de mágica e levem a dor para longe. Basta ver que, muitas vezes, os meses e os anos passam, mas o sofrimento não.
Como encarar a questão não é caminho dos mais fáceis. Algumas pessoas tendem a criar subterfúgios emocionais que dificultam o retorno da vida aos trilhos. Há aquelas tão racionais que só são capazes de entender os fatos por um prisma meramente intelectual e se tornam teóricas da própria dor. Outras se mantêm em uma situação de sofrimento perene, reclamam de todos ao redor, da vida ou do universo e exigem cuidados e atenção constantes. “Algumas pessoas permanecem apegadas a um luto patológico, à melancolia e jogam a responsabilidade sobre o outro”, explica a psicanalista Sylvia Loeb, do Instituto Sedes Sapientiae, de São Paulo. “Elas ficam no papel de vítima a vida inteira para não precisarem sair do lugar, para não assumirem sua responsabilidade na briga, na separação, na perda do emprego, ou seja, diante de sua própria vida.”
Seja como for que você reage à situação, uma coisa é certa: ficar parada na estação é que não pode. É preciso agir sem demora. Uma alternativa para elaborar tantas emoções é falar, simples assim. Nessas horas, terapia pode ajudar muito. Se ao partilhar o problema com um amigo já ficamos aliviadas, imagine com um profissional, capaz de decifrar as entrelinhas do que dizemos. “Se o sentimento não for entendido, digerido e elaborado, pode sobrar tristeza, rancor e até doenças, que às vezes levam à depressão”, explica Sylvia. “Quando se vive um assunto de verdade e se processa aquilo, não é mais preciso falar, porque já passou.”
Foi justamente se expressando que a publicitária paulista Cristiana Guerra, que já fazia terapia havia cinco anos, encontrou forças para continuar a viver e a cuidar de seu bebê. Nesses grandes descarrilamentos da vida, ela ficou viúva no sétimo mês de gestação. Envolvida em uma mistura de sentimentos, Cristiana enfrentou o que chamou de “o pior e o melhor ano”, e precisou lidar com o conflito interno de perder e ganhar ao mesmo tempo. Algumas vezes, se sentiu injustiçada por querer morrer e não ter esse direito, já que ainda carregava seu filho na barriga. Para aliviar a pressão da dor, começou a escrever o blog Para Francisco, em que resolveu transformar todas as suas lembranças sobre o namorado em poemas que o tempo e a memória não poderiam apagar. “Como escrevia para o meu filho, procurava mostrar o lado positivo da vida para que eu também acreditasse que havia um”, conta. Na mesma época, Cristiana percebeu o quanto era amada pelos amigos e aprendeu a dizer “preciso de você”.
“Se o sentimento não for entendido, digerido e elaborado, pode sobrar tristeza, rancor e até doenças, que às vezes levam à depressão.”
Sylvia Loeb, psicanalista
Deixe doer
Além de procurar um ombro amigo, também é essencial aceitar a dor como um componente do processo e não brigar com ela. “Quanto mais ela é combatida, mais dolorosa fica e mais demora a passar”, ensina o psicoterapeuta Fábio Oliveira, de Belo Horizonte. Para ele, o importante é entendermos que todas as situações que aparecem em nossa vida nos trazem um aprendizado e só nos resta procurar perceber o que aquele momento quer nos ensinar sobre nós mesmos.
Ao que acrescenta a monja Cohen, fundadora da comunidade Zen Budista, de São Paulo: “Na dor, seja a dor”, recomenda. Segundo ela, esse sentimento é importante para nos mostrar onde está o problema e nos estimular a perseguir o caminho da cura. “Cada obstáculo, dificuldade ou perda é uma porta, uma entrada, uma possibilidade de mudança, um novo encontro.”
Para a publicitária Marina Durante, nascida em Curitiba, foi exatamente o que aconteceu. Ela se casou com o primeiro namorado, deixou família, emprego e a casa que estava construindo na capital paranaense para acompanhá-lo na mudança para São Paulo. Depois de dois anos de união, meses em crise e diversas ameaças de separação, Marina se deu conta de que ele não a incluía mais em sua vida e estava tendo um caso com outra mulher. Quando Marina resolveu internamente que seu casamento tinha, de fato, acabado e se disponibilizou a experimentar o momento presente, mesmo ainda tendo raiva do ex-marido e medo de se envolver de novo, conheceu Rafael. Em pouco tempo os dois começaram a namorar e ele, que era do Rio de Janeiro, se mudou para São Paulo para ficar mais perto dela. Em seis meses foram morar juntos e, em janeiro deste ano, comemoraram o teste de gravidez positivo.
Cristiana Guerra também colheu frutos positivos de sua história. Em novembro do ano passado, lançou o livro Para Francisco (editora Arx). Nele, reúne os posts do blog e alguns textos inéditos e quer que mais pessoas conheçam sua história e se deliciem com ela. Ao mesmo tempo, a publicitária entende o lançamento como o fechamento de um ciclo. “Não vou ficar falando sobre esse assunto para sempre, agora vou falar de outras coisas.” Com sua atitude, ela seguiu outra regra importante da monja Cohen: tem uma hora que é preciso desapegar da dor, deixar que ela vá embora e voltar a sorrir para a vida.
Amadurecer
A boa notícia é que, à medida que acumulamos experiências, é possível que fique mais fácil lidar com as inevitáveis perdas. Mais do que maturidade, o psicoterapeuta Fábio Oliveira chama isso de “maturescência”, pois enquanto vivermos estaremos numa longa jornada de amadurecimento e transformação, que consiste em aceitar que tudo, absolutamente tudo, tem início, meio e fim. Marina sabe que seu novo casamento pode não durar para sempre, mas diz que, se já superou uma separação antes, não será isso que irá derrubá-la. No momento, ela não está preocupada com esse assunto e, enquanto espera seu bebê, aproveita para dar valor a cada detalhe de um relacionamento, o que antes lhe passava despercebido. O hoje é o importante. Viva os bons momentos, porque eles também vão passar.
Fonte: Bons Fluídos
De vez em quando, a vida parece que saiu dos trilhos: um grande amor vai embora, uma pessoa querida morre, um amigo o trai, um filho se muda para outro país, o emprego de anos é perdido inesperadamente. Nesses momentos, fica difícil perceber qualquer coisa além da raiva e da dor e, por mais que muita gente lhe diga que a situação é passageira, a sensação é de que, dessa vez, vai durar para sempre. Acredite: tudo passa e tudo sempre passará, como diz a música Uma Onda, inspirada composição da dupla Lulu Santos e Nelson Motta.
Mas atenção: infelizmente milagres não existem e para sair do buraco você também precisa dar uma força. Afinal, em momentos difíceis, o que mais se ouve é que só o tempo e a paciência são capazes de curar tudo. Antes fosse! Engana- se quem espera que eles, sozinhos, façam alguma espécie de mágica e levem a dor para longe. Basta ver que, muitas vezes, os meses e os anos passam, mas o sofrimento não.
Como encarar a questão não é caminho dos mais fáceis. Algumas pessoas tendem a criar subterfúgios emocionais que dificultam o retorno da vida aos trilhos. Há aquelas tão racionais que só são capazes de entender os fatos por um prisma meramente intelectual e se tornam teóricas da própria dor. Outras se mantêm em uma situação de sofrimento perene, reclamam de todos ao redor, da vida ou do universo e exigem cuidados e atenção constantes. “Algumas pessoas permanecem apegadas a um luto patológico, à melancolia e jogam a responsabilidade sobre o outro”, explica a psicanalista Sylvia Loeb, do Instituto Sedes Sapientiae, de São Paulo. “Elas ficam no papel de vítima a vida inteira para não precisarem sair do lugar, para não assumirem sua responsabilidade na briga, na separação, na perda do emprego, ou seja, diante de sua própria vida.”
Seja como for que você reage à situação, uma coisa é certa: ficar parada na estação é que não pode. É preciso agir sem demora. Uma alternativa para elaborar tantas emoções é falar, simples assim. Nessas horas, terapia pode ajudar muito. Se ao partilhar o problema com um amigo já ficamos aliviadas, imagine com um profissional, capaz de decifrar as entrelinhas do que dizemos. “Se o sentimento não for entendido, digerido e elaborado, pode sobrar tristeza, rancor e até doenças, que às vezes levam à depressão”, explica Sylvia. “Quando se vive um assunto de verdade e se processa aquilo, não é mais preciso falar, porque já passou.”
Foi justamente se expressando que a publicitária paulista Cristiana Guerra, que já fazia terapia havia cinco anos, encontrou forças para continuar a viver e a cuidar de seu bebê. Nesses grandes descarrilamentos da vida, ela ficou viúva no sétimo mês de gestação. Envolvida em uma mistura de sentimentos, Cristiana enfrentou o que chamou de “o pior e o melhor ano”, e precisou lidar com o conflito interno de perder e ganhar ao mesmo tempo. Algumas vezes, se sentiu injustiçada por querer morrer e não ter esse direito, já que ainda carregava seu filho na barriga. Para aliviar a pressão da dor, começou a escrever o blog Para Francisco, em que resolveu transformar todas as suas lembranças sobre o namorado em poemas que o tempo e a memória não poderiam apagar. “Como escrevia para o meu filho, procurava mostrar o lado positivo da vida para que eu também acreditasse que havia um”, conta. Na mesma época, Cristiana percebeu o quanto era amada pelos amigos e aprendeu a dizer “preciso de você”.
“Se o sentimento não for entendido, digerido e elaborado, pode sobrar tristeza, rancor e até doenças, que às vezes levam à depressão.”
Sylvia Loeb, psicanalista
Deixe doer
Além de procurar um ombro amigo, também é essencial aceitar a dor como um componente do processo e não brigar com ela. “Quanto mais ela é combatida, mais dolorosa fica e mais demora a passar”, ensina o psicoterapeuta Fábio Oliveira, de Belo Horizonte. Para ele, o importante é entendermos que todas as situações que aparecem em nossa vida nos trazem um aprendizado e só nos resta procurar perceber o que aquele momento quer nos ensinar sobre nós mesmos.
Ao que acrescenta a monja Cohen, fundadora da comunidade Zen Budista, de São Paulo: “Na dor, seja a dor”, recomenda. Segundo ela, esse sentimento é importante para nos mostrar onde está o problema e nos estimular a perseguir o caminho da cura. “Cada obstáculo, dificuldade ou perda é uma porta, uma entrada, uma possibilidade de mudança, um novo encontro.”
Para a publicitária Marina Durante, nascida em Curitiba, foi exatamente o que aconteceu. Ela se casou com o primeiro namorado, deixou família, emprego e a casa que estava construindo na capital paranaense para acompanhá-lo na mudança para São Paulo. Depois de dois anos de união, meses em crise e diversas ameaças de separação, Marina se deu conta de que ele não a incluía mais em sua vida e estava tendo um caso com outra mulher. Quando Marina resolveu internamente que seu casamento tinha, de fato, acabado e se disponibilizou a experimentar o momento presente, mesmo ainda tendo raiva do ex-marido e medo de se envolver de novo, conheceu Rafael. Em pouco tempo os dois começaram a namorar e ele, que era do Rio de Janeiro, se mudou para São Paulo para ficar mais perto dela. Em seis meses foram morar juntos e, em janeiro deste ano, comemoraram o teste de gravidez positivo.
Cristiana Guerra também colheu frutos positivos de sua história. Em novembro do ano passado, lançou o livro Para Francisco (editora Arx). Nele, reúne os posts do blog e alguns textos inéditos e quer que mais pessoas conheçam sua história e se deliciem com ela. Ao mesmo tempo, a publicitária entende o lançamento como o fechamento de um ciclo. “Não vou ficar falando sobre esse assunto para sempre, agora vou falar de outras coisas.” Com sua atitude, ela seguiu outra regra importante da monja Cohen: tem uma hora que é preciso desapegar da dor, deixar que ela vá embora e voltar a sorrir para a vida.
Amadurecer
A boa notícia é que, à medida que acumulamos experiências, é possível que fique mais fácil lidar com as inevitáveis perdas. Mais do que maturidade, o psicoterapeuta Fábio Oliveira chama isso de “maturescência”, pois enquanto vivermos estaremos numa longa jornada de amadurecimento e transformação, que consiste em aceitar que tudo, absolutamente tudo, tem início, meio e fim. Marina sabe que seu novo casamento pode não durar para sempre, mas diz que, se já superou uma separação antes, não será isso que irá derrubá-la. No momento, ela não está preocupada com esse assunto e, enquanto espera seu bebê, aproveita para dar valor a cada detalhe de um relacionamento, o que antes lhe passava despercebido. O hoje é o importante. Viva os bons momentos, porque eles também vão passar.
Fonte: Bons Fluídos